quarta-feira, 25 de março de 2009

Saudade de um estranho: o meu avô.


Tenho saudades do meu avô. Lembro-me dele de cadeira de rodas e do seu olhar doce, sereno e carinhoso. Que saudade dele! É engraçado eu sentir falta ou saudade, pois quando ele morreu eu tinha apenas quatro anos de idade e nem o conhecia direito.

O vô Solon deixou uma esposa e três filhos, que eu conheço, e um deles é o meu amado pai. Acho que se o vô estivesse vivo ainda conseguiria entender melhor meu pai e teria alguém a mais para conversar.

Lembro do seu rosto, do seu corpo, mas infelizmente não consigo resgatar da memória os momentos em que estive com ele, só alguns. Minha avó tinha uma máquina de costurar, dessas antigas que eram grandes e tinham duas gavetas de madeira dos lados e, nesta máquina, o vô guardava alguns trocados que na época não lembro se eram cruzados ou cruzeiros e eu pedia dinheiro para comprar balas e ele ia lá no quarto, abria uma dessas gavetas e me dava várias moedas.

Aliás, essa é a única lembrança que tenho do vô Solon. Para mim, é triste não lembrar de mais momentos em que estive com ele, infelizmente. Vejo fotos em que a família toda está reunida na minha antiga casa, mas não lembro como foi a reunião e nem quando aconteceu.

Se ele estivesse vivo creio que muita coisa não teria acontecido e várias outras teriam se realizado. A vida nos prega umas peças e o destino nos leva, às vezes, à direções inesperadas. Talvez, se o vô ainda respirasse acho que conversaríamos muito sobre o Grêmio – paixão da sua vida – sobre o PMDB, sobre o pai e sobre as mulheres.

Também, acho que em todas as conversas que teríamos, estaríamos acompanhados de um bom chimarrão ou de uma cerveja estupidamente gelada, não sei se ele tomava chimarrão ou se bebia cerveja – creio que sim, mas com certeza uns cigarros nos acompanharia, pois meu avô fumava, também.

Solon de Lima Carvalho, pai do meu pai, meu avô, morreu em 1991 de câncer. O dia do enterro dele foi um dia feliz para mim. Nunca comentei com ninguém sobre isso, mas enquanto velavam o seu corpo e o enterravam, eu fiquei na casa de uma amiga das minhas irmãs, pois não tinha onde ficar, visto que toda a família estava no velório e posteriormente no enterro e como eu tinha apenas quatro anos, meus pais resolveram me deixar na casa dela. Minha felicidade se dava pelo motivo de que eu era apaixonado por essa amiga das minhas irmãs, então, estar na casa dela era ótimo para mim.

Era inocente e não sabia o que estava acontecendo. É engraçado, hoje, lembrar da minha felicidade naquele dia tão triste. Não tinha consciência do que estava acontecendo, pois se soubesse com certeza eu choraria muito.
Hoje, sinto que uma parte da minha história ficou em branco por eu não ter conhecido meu avô melhor. Creio que seríamos bons amigos e dividiríamos bons cigarros, bebendo e conversando.

Meu primo, uma vez, me disse que ele era meio “esquentado” e que não levava desaforo para casa. Para mim é difícil aceitar tal fato, pois a imagem que tenho do meu avô é a de que era um homem calmo e romântico. Talvez eu pense assim por lembrar justamente do momento em que estava debilitado por causa da doença.

Queria que ele estivesse aqui comigo hoje... Acho que meu pai ficaria muito feliz se isso acontecesse. Queria que o vô Solon me desse mais umas moedas para eu comprar balas. Se eu soubesse que em pouco tempo nunca mais iria vê-lo, teria guardado, juntado, todas as moedas que ele me deu, só para poder mostrar para os outros e dizer que tinha sido meu avô que me deu.

Há pouco tempo visitei minha avó, na casa dela, em Rosário do Sul, e fiquei muito emocionado quando ela me deu umas abotoaduras do meu avô. Estava me arrumando para ir a um baile social e ela me deu esse presente inesquecível. Lembro que a minha emoção era tanta que queria usá-las naquela noite, mas a vó me explicou que não daria, pois deveria descosturar e desmanchar algumas coisas no punho da camisa e não conseguiria fazer a tempo.

Não importa se não usei e se não vou usar em breve as abotoaduras, mas o relevante, mesmo, é que com elas aqui comigo sinto meu avô mais perto de mim.

Que saudade do meu avô que nem bem conheci.

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